a capacidade de ficar só é a condiçao da capacidade de amar

A concentração é bem mais difícil de praticar em nossa cultura, em que tudo parece agir contra a capacidade de concentrar-se. O passo mais importante no aprendizado da concentração é aprender a ficar só consigo mesmo, sem ler, sem ouvir rádio, sem fumar, sem beber. Na verdade, ser capaz de concentrar-se significa ser capaz de ficar só consigo mesmo — e esta capacidade é precisamente uma condição da capacidade de amar. Se me ligo a outra pessoa porque não posso suster-me por meus próprios pés, ele ou ela podem ser um salva-vidas, mas a relação não é a de amor. Paradoxalmente, a capacidade de ficar só é a condição da capacidade de amar. Quem quer que tente ficar só consigo mesmo descobrirá quão difícil isso é. Começará a sentir-se inquieto, nervoso, ou mesmo a experimentar considerável ansiedade. Estará disposto a racionalizar sua má vontade em continuar com essa prática pensando que ela não tem valor, é simplesmente tola, toma muito tempo, e assim por diante. Observará também que lhe vêm à mente todas as espécies de pensamento, que tomam conta dele. Ver-se-á a pensar em seus planos para o resto do dia, ou numa dificuldade no trabalho que tem a fazer, ou aonde ir à noite, ou em qualquer número de coisas que lhe encherão a mente — em lugar de permitir que ela se esvazie. Seria útil praticar uns poucos e muito simples exercícios como, por exemplo, sentar-se em posição repousada (nem espreguiçada, nem rígida), fechar os olhos e tentar ver em frente deles uma tela branca, tentar remover todos os pensamentos e imagens que interferem, tentar acompanhar a própria respiração; não pensar a respeito dela, nem forçá-la, mas simplesmente acompanhá-la — e, ao fazê-lo, senti-la; tentar, além do mais, ter o senso do seu “Eu”; eu = mim mesmo, como o centro de minhas forças, como o criador de meu mundo. Dever-se- ia, pelo menos, fazer esse exercício de concentração todas as manhãs durante vinte minutos (se possível, mais) e todas as noites antes de deitar-se. ”.
~ Erich Fromm, em “A Arte de Amar”, pg 84